Nesta temporada de 2022 assistimos o Inter viver dois anos em apenas um. Praticamente metade do ano foi de um filme de terror, daqueles de meter medo mesmo. O auge dessa assombrosa parte da temporada foram projeções – inclusive feitas corretamente neste blog – de que o Inter corria sérios riscos de cair se o time continuasse com as mesmas opções de jogadores que já há muito tempo tinham acumulado fracassos por aqui e se somássemos a isso um treinador que simplesmente não funcionou aqui no Beira-Rio.
Aí veio a queda de Medina e a chegada de Mano e Autuori. E a chave virou. E o que era filme de terror passou a ser um filme de suspense com pitadas de ação. Será que vai dar? Será que o Palmeiras escorrega? Será que a Sulamericana seria um caneco possível? Será? Será?
Passamos a nos fazer essas perguntas, porque obviamente, o time era outro e onde havia medo surgiu esperança. Onde havia desconfiança brotou firmeza e mesmo com uma eliminação dolorosa contra o Melgar o time se aprumou, fazendo-nos acreditar em um 2023 muito melhor.
Mas há algumas explicações para o que aconteceu com o Inter. Embora Autuori tenha saído sem dizer nem tchau, tenho convicção que ele foi peça importante para organização interna e calmaria que vive o clube nestes dias atuais. Nosso primeiro reforço para 2023, aliás, já foi contratado para assumir o lugar deixado por Paulo Autuori.
Com Mano Menezes o time viveu seus melhores jogos e adquiriu um padrão tático, e até anímico, desenvolveu um bom nível de competição, que permitiu ao Inter enfrentar os melhores do BR e ficar, nos jogos de vai-e-vem, em vantagem. Com exceção do Corinthians (que empatamos as duas), dobramos todos os outros adversários mais parrudos neste ano.
A preparação física também mudou, e com ela também notamos um aumento da nossa saúde para competir, combater e ter gás para encarar os últimos minutos de cada partida com bastante intensidade. Acabaram-se os dias de babar na gravata. Vários foram os jogos em que conseguimos gols no finzinho das peleias.
Entretanto, em que pese estes destaques feitos acima, me parece que é no perfil dos jogadores nosso maior trunfo para 2023 e que, neste 2022, foi a mola que impulsionou o sólido trabalho de Mano: nossos antes depressivos e acabrunhados atletas, que sofriam um revés e entregavam os pontos, foram sendo paulatinamente substituídos por jogadores com mais fibra, resiliência, inteligência e disposição. Saíram da sala os gatos gordos (sem referência a nenhum ex-jogador que era considerável permutável) para que o espaço fosse ocupado por gente com fome de bola e de títulos. Os melhores foram cavoucando seu espaço no time.
O Inter lutou até o fim dessa temporada porque Mano e toda a comissão técnica incutiram isso na cabeça de jogadores que fazem questão te fazer história por aqui ao invés de pensarem apenas no contracheque. E a simbiose foi perfeita. O time ‘pegou liga’ e hoje em dia é muito, muito difícil de vencer o Inter. A torcida sacou isso. O grupo sabe disso. O Mano também sabe disso. Os quero-queros do Beira-Rio já ostentam a famosa plaquinha ‘eu já sabia’ a este respeito.
Eu sempre disse por aqui que entendo o futebol como sendo um tripé: anímico, físico e tático/técnico. Quando um time está equilibrado nestes três pilares ele é forte candidato a vencer as competições que disputa. Não adianta ser forte em um ou mesmo dois itens, se um dos pilares falhar, provavelmente a equipe será derrotada. Time forte fisicamente, mas ruim de bola não chega a lugar nenhum. Time de excelentes jogadores, mas sem mentalidade e controle psicológico, também afunda. E time desorganizado eu não preciso nem falar, pois ele nem chega a decolar, mesmo com bons valores no grupo.
Notem, senhores, que atualmente, o Inter preenche estas três condições. Nosso time tem ânimo e controle emocional; nosso time é organizado taticamente e com isso a técnica de alguns expoentes pode se sobressair; e finalmente, temos força nas pernas e ar nos pulmões que permitem que os caras corram, briguem e combatam do início ao fim de cada partida. Somos um time com a infraestrutura completa para vencer.
Em 2023 teremos, todavia, uma temporada cheia de desafios, com muitos jogos e muitas viagens, o que diminui o tempo para treinar e recuperar a equipe. Vamos precisar de alguns reforços e eu não quero finalizar minha reflexão tratando de obviedades. Quero projetar algo que me parece, desde já, um deslize tremendo, para não dizer equívoco, e que parece se avizinhar pelos corredores do Beira-Rio. O Inter não deveria, de jeito nenhum, jogar o estadual com o time principal. Mas temo que vá fazer esta escolha.
O Gauchão deveria servir para rodar os garotos, colocar o time principal em campo apenas no Beira-Rio para ir pegando ritmo de jogo lentamente, porque quando a fase de grupos da LA23 começar, logo se inicia o BR23. E com isso as viagens, tempo para recuperação e treinamento diminuem muito.
Daí o motivo de eu achar que o estadual deveria ser usado para garimpar alguns bons reforços na base que precisam de rodagem, enquanto o time principal vai se preparando com mais tempo e qualidade em seus treinamentos e parte física, além de receberem preparo psicológico adequado para encarar o ano todo com a faca entre os dentes.
Enquanto o time principal se prepara, que jogue o reserva, ou mesmo um ‘misto quente’, porque os garotos precisam de tempo em campo para fazer o que todo guri faz: errar. E eles precisam errar em uma competição de menos peso. E precisam errar para que possam, justamente, aprender com seus erros e provar para o Inter que são capazes de envergar a camisa vermelha.
Que venha 2023, porque depois de muito, muito tempo, será a primeira vez que iremos iniciar um ano com boa organização.
Rafa Mallmann